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Padre Ático Fassini, MS
Setembro, 2022
Curitiba, PR
A Província Imaculada Conceição celebra, no final de janeiro de 2023, cinquenta anos de Assembleias Provinciais de relevante significado para a sua vida religiosa e ministério.
A Assembleia Provincial foi um sonho gestado nas entranhas de um pesadelo vivido pela Província nos idos de 1960-1973. Para melhor compreender a intensidade de vida desse passado, busco inspiração no título do clássico romance “O Tempo e o Vento”, de Érico Veríssimo.
O tempo é o que se fez. O vento fica para animar o que vem.
Do tempo da primeira Assembleia Provincial em janeiro de 1973, em seus antecedentes e consequentes, tomei parte direta como Coordenador Provincial. Jovem, inexperiente, fora eleito pelo Capítulo Provincial em setembro de 1970. Uma ousadia, sim, forçada pelas circunstâncias que pesavam sobre a comunidade da Província. A atual avaliação dos fatos de então me faz temeroso, dado o envolvimento pessoal vivido. Desse tempo carrego no coração, porém, um grande amor compassivo pela Província sofrida, um amor que ainda me faz respirar.
1) O TEMPO:
Coisas que teceram o véu do tempo: o sonho e o pesadelo.
A década de 1960 foi sumamente significativa para a Igreja e a Congregação. O clima eclesial e congregacional era luminoso e esperançoso em razão do Concílio Vaticano II realizado entre os anos 1962 e 1965. Um profundo horizonte de ideais a respeito da vida eclesial e religiosa, da prática litúrgica, e da evangelização no mundo moderno envolveu o Povo de Deus. A Igreja era desafiada a se converter, a romper limites para deixar espaço à liberdade do Espírito do Senhor que sobre ela soprava. Num clima sinodal, a Igreja era impelida a dar novo testemunho de Cristo e adotar novas práticas evangelizadoras, adequadas para o processo civilizatório em curso na humanidade.
A II Conferência do Episcopado Latino-americano (CELAM), realizada em Medellín em 1968, trouxe de forma impactante para o chão da América Latina as diretivas do Concílio Vaticano II. Profunda alegria foi vivida em virtude da resposta às expectativas dos muitos cristãos, dada pela Igreja latino-americana. O clima eclesial fez germinar as Comunidades de Base, os Círculos Bíblicos, a Leitura Orante da Bíblia, a Teologia da Libertação, a inserção de Vida Religiosa em meios populares. A Igreja na América Latina reencontrava o encantamento por uma evangelização significativa para o mundo dos pobres de nossa terra. A bandeira da opção pelos pobres foi alçada ao alto de nossa Igreja.
Nem tudo, porém, era risonho. A ditadura militar foi implantada em 1964. Grupos de cristãos, de padres e de alguns Bispos travavam o andamento da Igreja conciliar. Apesar das dissensões pontuais, porém, o tempo foi de exultação e de glória pelo martírio de leigos, religiosos, padres e Bispos, praticado pela ditadura militar. O martírio foi a chancela de Deus dada à ação de Igreja na América Latina e Brasil. Face à opressão ditatorial, a consciência libertária de cristãos assumiu engajamentos corajosos na luta pela democracia. A Igreja falou e agiu com a coragem dos profetas.
Nossa Província comungou dessa experiência. Apesar de resistências fracas e pontuais aos ares conciliares, o conjunto da Província estava aberto ao novo que chegava pelos caminhos da Igreja. O ideário conciliar penetrava a pastoral, a formação, a vivência comunitária. E a realidade do Brasil, pobre e oprimido, desafiava a Província a assumir a causa da evangelização libertadora.
No interno da Congregação, desde 1964 o processo de reformulação da Regra de Vida estava em curso. O Concílio havia determinado a todas as Famílias Religiosas o retorno às fontes. Era preciso ter acesso à intuição original genuína dos Fundadores para dar novo impulso ao carisma próprio de cada Congregação no seio da sociedade atual.
Uma Comissão criada pelo Capítulo Geral, em 1964, elaborou um anteprojeto de nova Regra de Vida. Em 1968, o Capítulo Geral Extraordinário analisou, aperfeiçoou e adotou um projeto “ad experimentum”. O Capítulo Geral Ordinário de 1970 retomou o texto e o transformou em Regra de Vida provisória, pela qual a Congregação se orientava. O Capítulo Geral de 1976 aperfeiçoou o texto e confiou ao Conselho Geral eleito na ocasião, a tarefa da redação final do projeto, depois de consultada passo a passo a Congregação inteira. O texto final, submetido ao Capítulo Geral de 1982, recebeu o formato atual de nossa Regra de Vida. Foi um tempo de graça vivido pela Congregação em busca de seu carisma original, a Reconciliação. A Província no Brasil teve a graça de participar exaustivamente desse processo.
Nesse clima eclesial e congregacional, a Província abriu seu coração para o serviço aos pobres, em áreas pastorais de periferia. Fez-se missionária ao assumir o desafio da evangelização na Bahia. Deu novo rumo à formação inicial com a inserção de pequenas comunidades de estudantes em meios populares. Em Curitiba, os estudantes de Filosofia e Teologia se engajaram em movimentos universitários, comuns na época da ditadura.
Na época, em atitude sinodal, a Província se uniu a outras Congregações para a fundação do Instituto de Teologia de Curitiba, centro de formação de candidatos ao sacerdócio de várias Congregações e Dioceses. Desse Instituto, de grande abertura conciliar, alguns confrades saletinos participaram como Professores ou Diretores. O ITC foi berço de importantes personalidades eclesiásticas: Bispos, um Cardeal, Teólogos… Como sua abertura incomodava autoridades eclesiásticas e militares, foi forçado a encerrar suas atividades no fim de 1973.
A Província, apesar de tudo, sentiu-se chamada a dispor de confrades para prestar colaboração à CNBB Regional e Nacional, à CRB Regional e à CRB Nacional. A comunhão com a Igreja do Brasil era fonte de gratificação para a Província, e de mediação privilegiada para a sua permanente abertura ao Espírito que animava a Igreja pelo mundo afora.
Sonho e pesadelo conviveram na década de 1960. Três focos de problemas penetraram no útero do pesadelo:
1º) A evasão de confrades da Província era sério problema. Antes da 1ª Assembleia Provincial de 1973, a sangria foi significativa. Prosseguiu depois e continua hoje em ritmo lento.
O Vaticano II sacudia o torpor da Igreja. Confrades, carregados de diferentes problemas pessoais, preferiam deixar a Congregação e o ministério sacerdotal. A suposta anomia ou vazio de orientações práticas na vida da Igreja pós conciliar, e na Congregação que se guiava por uma Regra de Vida “ad experimentum”, induzia a atitudes personalistas de muitos matizes. A laicização e secularização de membros da Província causou séria sangria com a desistência de confrades. A maioria dos membros da Província, porém, se manteve firme e fiel no trabalho pastoral e na Vida Religiosa.
Se na área pastoral o ambiente provincial era de firme e consciente empenho, na área estudantil um grave problema se introduzia na Província. Os dois centros de formação inicial, o Seminário Salette e o Instituto Salette não comungavam das mesmas ideias. O Seminário Salette alimentava um ideário empresarial. O Instituto Salette alimentava uma visão eclesial de abertura e de serviço ao povo dos pobres.
2º) Nessa época, o Instituto Salette acolhia cerca de trinta Professos, estudantes de Filosofia e Teologia. Muitos ideais surgiam, como o de viver em comunidades estudantis menores pelos bairros pobres de Curitiba, o de fazer a experiência operária com trabalho remunerado em empresas ou serviços municipais durante as férias. Como universitários, envolviam-se em atividades estudantis organizadas pelos Centros Acadêmicos. Era uma forma, pensava-se, de marcar a presença da Igreja nesse meio.
O momento era de intensa efervescência política por causa da ditadura reinante. A 1º de abril de 1964 fora instalada a ditadura militar no Brasil. Lançou o Brasil às trevas. A sociedade brasileira, a Igreja e a Província muito sofreram nesse período infernal.
O Instituto Salette, em Curitiba, se tornou alvo de permanente vigilância das forças policiais. O correio, o telefone e a casa eram estritamente controlados. A razão era a do envolvimento relativo de Escolásticos no movimento estudantil universitário em oposição à ditadura, e a da pregação dominical profética de padres da comunidade. Por conta disso, um escolástico foi condenado a dois anos de prisão, outro, presidente de Centro Acadêmico, depois de curto período de prisão se refugiou na clandestinidade. Um Padre recebeu carta do Comando de Caça aos Comunistas, com ameaças de morte, e foi fichado no DOPS pelo simples motivo de ser Superior dos saletinos. Outro Padre, para não ser preso, refugiou-se no exterior. Um clima de medo rondava a comunidade. No entanto, a prudente oposição ao regime prosseguia motivada pela premência do Evangelho.
Um problema que perturbava era a desistência de jovens professos. Muitos desistiam pouco tempo após a Profissão Religiosa. Os apelos da grande cidade, Curitiba, e de um diploma acadêmico criavam na mente dos jovens professos, com frágil formação para a vida religiosa e sacerdócio, a ânsia de desistirem para construir uma vida profissional bem sucedida. A formação liberal voltada para o sucesso na vida, recebida no Seminário Salette, tinha seu peso na decisão dos jovens. Pouco tempo depois de chegarem ao Instituto Salette, muitos partiam para se tornaram médicos, dentistas, advogados, engenheiros, empresários. Por essa razão, no início de meu mandato de Coordenador Provincial, tomei a iniciativa de despedir os que viviam essa duplicidade de opção de vida. Isso levou a um esvaziamento significativo do Instituto Salette. A preocupação na Província foi grande.
Em setembro de 1970, poucos dias após o Capítulo Provincial, a comunidade saletina do Rio de Janeiro foi invadida por forças militares disfarçadas que levaram dois Padres e um seminarista presos em razão de seu trabalho pastoral com a Juventude Operária Católica e a Ação Católica Operária. Presos em local desconhecido, foram torturados e por fim libertados sem culpa formada.
O Seminário Salette, por sua vez, desde 1954 passava por uma reforma institucional, exigida pelo Ministério da Educação. De Escola Apostólica sem registro oficial, passou a Seminário Salette com estatuto próprio registrado. A ampliação de seu espaço em razão do expressivo aumento do número de vocacionados se tornou necessária.
A Direção do Seminário Salette, instalada nos anos 60, reformou o estatuto, dando um poder discricionário ao Diretor, de forma tal que a Coordenação Provincial em pouco ou nada podia interferir. A Província como tal não era consultada. De maneira autocrática a Direção decidiu pela demolição da cúpula do Santuário, de seu altar mor e dos altares laterais.
O Seminário Salette aos poucos assumiu um caminho não mais de Casa de Formação de candidatos ao sacerdócio e vida religiosa, e sim, de formação geral de bons cidadãos. De Escola Apostólica assumiu a figura de Escola Agrícola. Era conhecida como Granja Salette, pretensa concorrente da grande Empresa Sadia que imperava na região.
Em determinado momento, no Seminário Salette havia cerca de 250 alunos internos que, a par dos estudos, prestavam serviço remunerado na Granja, o que hoje, segundo as atuais leis trabalhistas, não seria permitido. O ritmo de vida dos alunos era frenético. O comando da enorme estrutura da entidade estava exclusivamente nas mãos do Diretor. A administração era complicada, com um sistema contábil frágil e pouco transparente. As dificuldades financeiras levaram a hipotecar partes da propriedade do Seminário.
Havia um reservado sentimento de independência do Seminário Salette em relação à Província. Dado o grande número de alunos, foi preciso multiplicar as estruturas da entidade escolar. Na oportunidade foi adquirida uma grande propriedade nas cercanias de Ponta Grossa, Paraná, para lá instalar o 2º Grau. Belas ideias envolviam esse projeto, mas não correspondiam aos ditames eclesiais da época. A autoridade eclesiástica local impediu a concretização do projeto.
Ao mesmo tempo, foi instalada em Passo Fundo uma Casa de Formação para os estudantes de Filosofia. Em União da Vitória, com o esvaziamento do Noviciado, o Propedêutico ocupou a casa. Os alunos, em Marcelino Ramos, recebiam boa formação humana, num sistema de ensino agro industrial, mesclada com elementos de interesse religioso ou sacerdotal. O resultado era imprevisível. Era visível, porém, o desvio de destinação do que fora a Escola Apostólica. O Seminário Salette se tornou um problema para a Província.
Quando, como Coordenador Provincial, a partir de 1970 visitava a comunidade de Marcelino Ramos encontrava um clima de frieza, com pouco diálogo, e normalmente sem a presença do Diretor. Dada a complexa realidade do Seminário Salette, passei a exigir uma progressiva diminuição do número de alunos para aliviar a situação financeira da entidade. Assim se fez, mas, sem mudanças na orientação da entidade para que se privilegiasse o objetivo original de Seminário Salette como centro de formação sacerdotal e de vida religiosa. Para maiores informações, veja-se a obra “Crônicas de uma missão”, p. 214s, de Pe. Atico Fassini MS. É ilustrativo o texto de Nilson Isaías Pegorini, “O trabalho e o empreendimento econômico do Seminário Salette e Granja Salette”, in “Seminário Salette – Significado de uma formação integral”, Ed. CRV, Curitiba, 2022, p. 41s.
Era essa a problemática situação provincial em 1970, quando assumi a Coordenação Provincial. E assim se prolongava. Houve até quem sugerisse a venda de todos os bens da Província e que a renda fosse repartida entre todos para dar um fim a tudo. Sugestão fundada em desespero. Era preciso, pois, retomar o bom rumo, e intervir de modo objetivo no andamento geral da Província.
Em meados de 1972 o clima estava sobrecarregado. Para complicar, três confrades dentre meus colaboradores mais imediatos, naquele momento decidiram deixar a Congregação e o Sacerdócio. O Irmão João tinha falecido em março de 1971 deixando uma grave lacuna para as finanças da Província. Em 1969 Pe. Aloysio Franz MS, Ecônomo do Seminário Salette, havia deixado o ofício por estafa. Foi à Europa onde se fixou para o bem da Província. Na condução das finanças do Seminário Salette, Pe. Franz foi substituído por pessoa menos apta para o cargo, o que criou maiores preocupações.
3º) – O momento era oportuno para uma intervenção. Dada a gravidade dos acontecimentos, decidi, como Coordenador Provincial, com o apoio do Conselho Provincial, convocar uma Assembleia Provincial, a primeira em toda a Congregação, para o final de janeiro de l973. O objetivo era auscultar o pensamento da Província sobre sua real situação, e entregar em suas mãos a tomada de decisões necessárias, especialmente a relativa ao Seminário Salette.
Era o tempo de definição clara do carisma da Congregação, tempo propício para encaminhar a urgente reconciliação da Província consigo mesma. A ideia de uma Assembleia Provincial tomou consistência. O Superior Geral foi informado. O Instituto Salette foi o local estabelecido para o evento bendito.
O biblista Frei Gorgulho OP foi convidado a prestar assessoria durante um dia e meio, no início da Assembleia, para ajudar seus participantes a se abrirem ao Espírito e encontrar o bom caminho para a Província. A totalidade dos membros da Província fora convocada. Quase todos se faziam presentes, inclusive a Direção do Seminário Salette.
Após as reflexões iniciais de Frei Gorgulho, abri, como Coordenador Provincial, os trabalhos da Assembleia numa atitude de oração. O clima era de séria apreensão, de concentrada atenção, de forte emoção. Conclamei a todos para que assumissem a responsabilidade comum para a solução dos problemas da Província. Fiz breve descrição da problemática existente, sobretudo a relativa ao Seminário Salette, o nó que devia ser desatado. Incisivo, apresentei um desafio à comunidade provincial, insistindo para que a Assembleia encontrasse uma solução para o caso de Marcelino Ramos, do contrário renunciaria ao cargo de Coordenador Provincial.
Lamentos e choros foram ouvidos, sobretudo da parte de alguns responsáveis pelo Seminário Salette. Ponderações consistentes foram apresentadas. A questão foi livremente debatida num clima extremamente penoso, mas de oração e reflexão. Em conclusão, foi tomada a decisão da mudança na Direção do Seminário Salette, do desmonte da estrutura agroindustrial, e de outras medidas para o progressivo reordenamento da entidade segundo os objetivos da Província. O Diretor do Seminário Salette foi demitido. Um novo foi nomeado. A Província como um todo acabava de exercer sua autoridade maior para o próprio bem.
A Assembleia nomeou Pe. Isidro Perin MS como novo Diretor. Dada, porém, sua função de Pároco de Valença, na Bahia, solicitou um prazo de seis meses para assumir o novo cargo. Assembleia considerou o pedido e designou o Pe. Antônio Bortolini MS para suprir esse tempo de impedimento de Pe. Isidro.
A comunidade provincial reunida, percebendo a importância da Assembleia para a Província, decidiu também que, a cada ano, ao final de janeiro, se procedesse a nova Assembleia Provincial. Decisão vital que incidiu fortemente no processo de constante renovação da Província pelo dom do Espírito do Senhor Jesus.
2) O vento
O tempo foge. O vento fica para animar o que resta. E o Espírito é dado para renovar todas as coisas.
Após a Ressurreição do Senhor, os Apóstolos, consternados com a morte do Mestre, e reunidos em oração com Maria, a Mãe de Jesus, foram agraciados com o Espírito Santo em forma de forte vento, conhecido por Elias como leve brisa (At 2). A transformação dos Apóstolos foi imediata e grande. Logo puseram-se a anunciar e testemunhar a presença viva do Mestre Ressuscitado.
Creio firmemente que a Assembleia Provincial foi um momento de efusão do Santo Espírito sobre a Província. Um vento forte de vida, e prenhe de esperança, caracterizou a primeira Assembleia reunida, temerosa e confiante, em torno da Mãe da Reconciliação. Vida nova surgiu para a Província. Nova consciência de vida comunitária se formou com novo compromisso de vida religiosa e sacerdotal, entrelaçado com os ideais provinciais.
Após a Assembleia cada um voltou a seu lugar, com a consciência mais firme de que participa de uma comunidade onde não há lugar para atitudes personalistas divergentes dos objetivos comuns.
Acompanhei Pe. Antônio até Marcelino Ramos para introduzi-lo no cargo provisório. Pe. Isidro depois assumiu a pesada tarefa de reestruturar a entidade. Com a nova Direção, houve mudanças radicais na configuração do Seminário Salette. A vida foi retomada. O ex-Diretor, desejoso de permanecer em Marcelino Ramos, foi nomeado Pároco local.
Poucos meses depois da Assembleia, foi realizado em julho de 1973, o Capítulo Provincial que elegeu nova Coordenação, definiu o Estatuto Provincial com novas orientações. O Conselho de Província partilha desde então do governo provincial.
A transformação vivida, provocada pelas Assembleias Provinciais anuais, era sensível e se tornou motivo de admiração por parte das outras Províncias da Congregação.
O Capítulo Provincial de 1976 completou as determinações a respeito do andamento da Província e do Seminário Salette. Depois de difícil discernimento, decidiu pelo encerramento das atividades do Seminário Salette como Casa de Formação única e exclusiva na Província. Novas experiências de comunidades de formação já estavam em andamento, privilegiando-se os pequenos grupos. Novos critérios de admissão de candidatos foram assumidos. O Capítulo achou por bem levar a frente a nova experiência formativa.
As sucessivas Assembleias Provinciais tiveram grande importância para o revigoramento da vida religiosa e sacerdotal na Província. A cada ano, ao final de janeiro congregavam os confrades, animados pela alegria de encontrar os irmãos no diálogo sobre o que acontecia na Província e o que deveria acontecer. Era a expressão do vivo desejo de estar e caminhar juntos, no amor à causa comum.
As Assembleias foram sempre assessoradas por pessoas de relevo eclesial, Bispos, teólogos, moralistas, psicólogos e sociólogos, tais como: Dom Paulo Evaristo Arns, Dom Luciano Mendes de Almeida, Pe. Edênio Valle SVD, Pe. Antônio Silva, Pe. Márcio Fabri CSSR, Frei Antônio Moser OFM e outros. Dom Felipe Leddet OSB, Prior dos Beneditinos de Curitiba e “saletino honorário”, era presença fiel. Nas Assembleias, a riqueza teológica, os fundamentos bíblicos, as reflexões eclesiais sempre serviram de alimento essencial para a renovação da vida religiosa e sacerdotal e a revisão de vida da Província.
Ao longo dos cinquenta anos de Assembleias Provinciais, a comunidade provincial viveu transformações significativas:
Houve maior realce para a vida comunitária, valorizando as pequenas comunidades, sua vida de oração, reuniões e programas de formação permanente.
No período 1970-1973, à luz do Estatuto Provincial elaborado naquele tempo, a Província foi organizada em setores para facilitar e reforçar a vida comunitária e o programa comum de ação. Quatro setores foram definidos, todos fazendo reuniões periódicas: Setor Formação, Setor Pastoral Urbana, Setor Pastoral Rural e Setor Missão na Bahia. O Coordenador Provincial fazia-se presente. Com adaptações, essa prática perdura na Província.
A filiação dos membros da Província no sistema de saúde UNIMED tem valor comunitário. A Casa da Saúde é exemplo de fraternidade para com os doentes e idosos. A Capela da Reconciliação é um ícone.
Sempre evocando as premissas do Vaticano II, as diretivas de Medellín e as orientações pastorais da CNBB, a vida pastoral nas Paróquias foi valorizada. Atenção especial à pastoral em Santuários da Salette foi dada. Diversas Romarias da Salette interioranas são atendidas ocasionalmente pelos saletinos, especialmente no Paraguai. Foi reassumido o Santuário da Salette em Rio Elias, com Paróquias do Sudoeste do Paraná. A fundação e o serviço pastoral do Santuário da Salette em Caldas Novas foram confiados à Província, pelo Bispo de Ipameri/GO. Foram assumidas novas frentes missionárias, inicialmente na Rondônia e atualmente no Mato Grosso, A Equipe Missionária serviu à Igreja no Brasil por longos anos de trabalho pastoral e de promoção vocacional. As missões na Alemanha, em Moçambique, no Santuário da Salette, França, e na Administração Geral da Congregação em Roma, são expressão da comunhão da Província com a Congregação. Foi dada significativa colaboração aos trabalhos da CNBB e CRB Regionais do Paraná, e da CRB Nacional, em sinal de comunhão eclesial.
Desde o Capítulo Provincial de 1970 foram aperfeiçoadas as estruturas de governo provincial. Além do Capítulo Provincial, que passou a ser eletivo, o papel do Conselho de Província com reuniões anuais, é básico. A Assembleia Provincial anual analisa o andamento corrente da Província, encaminha propostas de decisão entregues ao Conselho Provincial ou ao Conselho de Província, e no início de cada mandato provincial vota as prioridades provinciais para o triênio. As decisões maiores no interesse da Província, normalmente são filtradas nas Assembleias antes de serem submetidas à definição da direção provincial. Reuniões periódicas do Conselho Provincial com setores específicos ainda são realizadas periodicamente. A Assembleia teve papel preponderante no episódio da criação e extinção da Fundação Salette. O Estatuto Provincial foi reformado para atender as novas exigências jurídicas. A forma de governo provincial foi sabiamente descentralizada.
A reforma do prédio do Instituto Salette serve a interesses de formação eclesial e religiosa, com bons resultados econômicos. A Casa Provincial, que assenta definitivamente a administração da Província, é um ganho.
Antes da primeira Assembleia Provincial a situação da Formação era problemática em todos os níveis. Depois da Assembleia foi lenta e dolorosa sua reestruturação. A dispersão dos formandos em pequenas comunidades, já antes e depois da Assembleia, nem sempre deu o resultado esperado pela falta de acompanhamento adequado. Era preciso encontrar o caminho certo para se chegar à estabilidade relativa que hoje vigora na formação.
Hoje, as comunidades diferenciadas de candidatos estão num bom caminho, com responsáveis diretos que as acompanham. A Equipe de Formação Provincial, através de suas reuniões com o Conselho Provincial, participa da responsabilidade pela boa qualidade da formação. O Noviciado passou por diferentes experiências. Por diversos anos funcionou em Marcelino Ramos, depois em Cochabamba, na Bolívia, e por fim voltou a Marcelino Ramos. Hoje está em São Paulo.
Em 1970 a situação financeira da Província era precária. Com a morte do Ir. João, em 1971, se agravou. A pobreza foi sentida de modo agudo nas Casas de Formação. A ida de Pe. Aloysio Franz MS para a Alemanha, com o objetivo de angariar recursos para a Província, trouxe grande alívio, o que prossegue pela dedicação dos confrades que lá trabalham na pastoral. O sistema de aposentadoria pelo INSS ajuda a enfrentar as dificuldades. Além de excelente assessoria contábil, a Província usufrui de competente assessoria jurídica.
O Fundo Irmão João e o Fundo da Saúde, com a contribuição anual de cada confrade da Província, colaboram para as necessidades da formação dos candidatos, e da assistência à saúde de confrades mais debilitados. Propriedades subaproveitadas foram alienadas para prover a construção de prédios de aluguel em benefício da Província.
Conclusão:
A situação da Província em seus diversos segmentos hoje se apresenta estabilizada, embora com desafios. É fruto da prática das Assembleias Provinciais anuais. São cinquenta. Cinquenta dons que a Bela Senhora, Mãe da Reconciliação, concedeu à nossa Província.
Creio firmemente que as Assembleias Provinciais foram a mediação privilegiada de Deus e da Bela Senhora da Salette. Por elas nossa Província segue elaborando um programa de revitalização no caminho da reconciliação. O vento do Espírito de Cristo, santificador e renovador de todas as coisas, continua soprando pelas sendas tantas vezes obscuras da vida, abrindo nossos ouvidos ao clamor do povo, e nossos olhos à realidade de cada dia. Nosso louvor seja dirigido aos céus.