ARTIGOS

Padre Silvano Maria Giraud (1830-1885)
O mais célebre dos Missionários de La Salette: místico, apóstolo, escritor

Menino e seminarista modelo

Estamos na França em 1830. Na ensolarada Provence, em uma pequena aldeia de nome Eguilles (situado a dez quilômetros da agradável cidade de Aix-en-Provence) na casa dos esposos Catherine Reynier e de Pierre Giraud, vem à luz, em 30 de setembro, um bebezinho a quem foi transmitido o batismo no dia seguinte, impondo-lhe o nome de François Emilio Sylvain.

Seu pai era padeiro e, no tempo livre, dedicava-se também ao cultivo da terra na fazenda “Grande Bastide”, propriedade dos seus pais.

O bebê crescia vivaz e sadio, mas à idade de nove meses, repentinamente começou a perecer.

O pai que era crente, embora não praticante, vendo-o em perigo de vida, consagrou-o à Nossa Senhora da Guia.

Maria escutou as suas súplicas sinceras e o bebê milagrosamente foi curado.

Silvano, crescendo, revelou-se um menino inteligente, sensível, bom, respeitoso, reservado e um pouco tímido (será por toda a vida).

Aquilo que surpreendia era a sua excepcional religiosidade, com respeito à idade: parava frequentemente na igreja à saída da escola, fazendo visita ao Santíssimo Sacramento, servia diariamente na Santa Missa e participava com prazer das procissões.

Este seu particular comportamento, não escapou ao novo pároco – Padre Albert – chegado na aldeia em 1838. Este começou a seguir o menino de modo especial, intuindo naquela alma, o germe de uma futura vocação sacerdotal.

Quando teve a confirmação do próprio interessado, não tardou e com a aprovação dos pais o acolheu na sua escola presbiteral, aberta na paróquia para poucos alunos. Ali, Silvano, permaneceu por quatro anos, recebendo uma educação severa, mas uma formação religiosa e moral muito sólida.

Em outubro de 1884, entrou no Seminário Menor de Aix, onde se distinguiu imediatamente pela sua acentuada inteligência, pela seriedade e empenho no estudo, pela ótima conduta e ainda mais pela sua singular piedade, dirigida especialmente à Eucaristia. Já então declarava que não tinha outro desejo além de pertencer apenas a Deus e de não ser nunca notado pelos homens!

Com os sucessivos anos de Seminário, a sua vocação se enraizou sempre mais. Era um aluno modelo pela obediência e docilidade para com os seus Superiores, mas também pela afabilidade e compreensão para com todos e pela sua intensa vida de oração. Aprofundava a sua cultura bíblica, dedicava-se à leitura da vida dos Santos (entre os quais escolhia São Francisco de Assis) e amava muito os pobres.

Em sua mente havia sempre um único objetivo: chegar logo à ordenação sacerdotal. Procurava atingir esta meta no contínuo recolhimento, na humildade, na ocultação, na caridade, na oração e na penitência.

Os seus progressos espirituais eram então contínuos e muito satisfatórios.

 

A meta tão sonhada

Era 17 de dezembro de 1853, tinha 23 anos. Naquele dia lhe foi conferido o presbiterado. O longo período de intensa preparação no Seminário, revelou-se fundamental para a formação da sua personalidade, alcançada especialmente sobre o exemplo e especial guia do seu mestre sulpiciano Padre Désobeau a quem se dirigirá também nos anos futuros para obter conselhos sobre questões particulares.

Dele não esquecerá nunca a máxima evangélica que lhe propunha frequentemente: “Se o grão de trigo caído na terra, não morre, não produz fruto” (Jo 12,24).

Eis alguns propósitos e anotações, formulados na vigília da sua ordenação em que está contido todo o programa da sua vida: “Ó meu Deus, desejaria morrer neste momento, se o meu sacerdócio não deveria ser aquele do teu Divino Filho, aquele dos Santos. É então essencial ser santos no sacerdócio! E ser sempre vítima humilhada como aquela que está sobre o altar: vítima e sacerdote juntos”.

 

Professor e pregador

            Inicia a sua missão sacerdotal desempenhando a tarefa que lhe foi confiada pela obediência, ou seja, professor junto aos meninos do Seminário. Cumpre este encargo com o máximo empenho, ciente que da sua obra depende a formação dos futuros padres. Enquanto isso, é convidado a pregar em diversas igrejas, principalmente no Advento e na Quaresma e, em 1856, o faz também na sua aldeia natal, por ocasião do Jubileu. Tem somente 26 anos. Fala de fé, de caridade, de santidade, com tal convicção, fervor, clareza e simplicidade que todos os seus ouvintes foram conquistados. Muitos desses se comovem até às lágrimas e a assembleia chega até a aplaudi-lo na igreja!

            A sua palavra, profunda, ardente, culta e nunca retórica, toca a alma, sacode-a, converte-a.

            Os seus sermões são definidos unicamente de “alta oratória”, pela sua extraordinária eloquência e profundidade que o distinguem dos outros sacerdotes. Assim, relutantemente, torna-se um orador muito apreciado e solicitado. Assustado porém desta notoriedade, decide deixar os “grandes púlpitos” e se dedicar apenas aos Cursos dos Exercícios Espirituais nos pensionatos e às Monjas Capuchinhas de Aix.

 

Missionário de La Salette

            Talvez apenas em contraste a toda esta admiração que crescia em torno a ele, mas principalmente, sem dúvida, por um especial chamado de Deus, sente nascer no coração uma atrativa viva e urgente por uma renúncia total, abraçando um estado de vida mais retirado e escondido. Pensa em ser religioso, talvez um frade capuchinho.

Mas o Senhor tem outros projetos para ele. Uma voz mais precisa e insistente se faz sentir misteriosamente na sua alma: chamando atenção para um forte apelo à Virgem chorando de La Salette.

Ele está tão conquistado que declara: “Sinto que a Virgem quer que eu me torne o missionário das suas lágrimas e das suas dores”.

Mas como era próximo a La Salette? Ele havia falado em 1856 com um jovem subdiácono, de retorno do Santuário, dando-lhe também uma medalha e algumas anotações históricas sobre a Aparição. Com o passar dos meses, esta sua vocação se consolida. Ele fala com alguns sacerdotes de sua confiança e reza ao Espírito Santo para que o ilumine. Por fim está verdadeiramente convicto que esta seja a sua estrada.

Assim escreve para uma Superiora de um convento com quem estava em contato há anos: “Me parece que seria feliz de pertencer à Congregação dos Padres de La Salette, penso há algum tempo”. Em julho de 1857, decide comunicar aos  pais a sua intenção de subir aquela Santa Montanha para os seus Exercícios Espirituais anuais, especificando que estava “absolutamente seguro”. Evidentemente para ele era um compromisso irrenunciável e uma vocação definitiva.

De fato escreve: “Não tenho a mínima dúvida que a minha vocação é aqui, considerando as provas das quais tenho o doce e esmagador pressentimento. Abraço com amor esta nova missão que Maria me dá”.

Também os seus superiores aprovaram este seu passo importante. Então, descendo a montanha, vai imediatamente comunicar ao Bispo de Grenoble este seu ardente desejo de fazer parte daquele pequeno grupo de Missionários, perdidos lá em cima nas montanhas. Padres corajosos que foram escolhidos, alguns anos antes, entre o clero diocesano, para prestar a sua assistência espiritual, no verão aos peregrinos que se dirigiam ao Santuário, e no inverno, para coadjuvar as várias paróquias da Diocese, com a evangelização. A sua vida lá em cima, nos locais da Aparição, era isolada e muito desconfortável, até mesmo heróica,  já que não dispunham de nada além de uma pobre e esburacada cabana de lenha, construída junto à primitiva capela.

 

Os votos religiosos

Constituíram-se, então, numa verdadeira Comunidade Religiosa, pronunciando os votos apenas em 2 de fevereiro de 1858. Padre Silvano Giraud chega a Grenoble para entrar no nascente Instituto em 13 de novembro de 1858. Depois do regular ano de noviciado, emitiu a sua profissão religiosa em 2 de fevereiro de 1860.

Consagra-se logo totalmente à Nossa Senhora e assegura que sente a sua sensível proteção que o assiste e o sustenta no seu exigente apostolado ao qual se dedica sem reservas até ao extremo de suas forças, como confidencia a um seu amigo sacerdote. “Aqui, sem vocação, não se resistiria!”. O auxílio particularíssimo da Virgem o faz exclamar: “Tenho o sentimento interior que posso pedir tudo para a Nossa Senhora de La Salette”.

Da sua parte, promete corresponder a tanta graça, mantendo-se sempre humildemente no último lugar e fazendo tudo aquilo que não agrada a ninguém.

O seu Superior, Padre Archier, deposita nele muita confiança e estima e por isso lhe confia muitos encargos de responsabilidade: missões ao povo, cursos de Exercícios Espirituais, confissões, direção da Obra de Adoração Perpétua em Grenoble, imprimir livros espirituais.

Estas suas publicações iniciam com um “pequeno livro” – mas profundo de conteúdo – dedicado mesmo à Nossa Senhora, intitulado “O Livro da Devoção à Nossa Senhora Reconciliadora de La Salette” (24 de março de 1863). O segue um outro que se liga ao anterior, intitulado “A vida de união com Maria, Mãe de Deus”. E em seguida muitos outros ainda.

A sua obra-prima, porém – aquilo que representa a síntese de toda a sua doutrina espiritual – resta o volume “Sacerdote e Hóstia”, dedicado sobretudo aos sacerdotes e aos Clérigos, mas – segundo a intenção do Autor – também a todos os batizados, porque também eles, na força da graça recebida com o Sacramento, devem atender à santidade. Este exigente programa de se tornar “Sacerdote Vítima”, será o fundamento sobre o qual assentará toda a sua existência.

Redige também a revista “Anais de Nossa Senhora de La Salette” por ter ligações com todos os devotos da Aparição.

 

Superior

Em 2 de fevereiro de 1865, vencendo os cargos da Comunidade, Padre Giraud foi unanimemente eleito Superior e o será por bons onze anos consecutivos. Ele, cada vez aceita o encargo entre as lágrimas, porque a sua profunda humildade o fazia se sentir incapaz de suportá-lo. Por isso, embora acolhendo prontamente a vontade de Deus, confia a Maria o governo da Comunidade, nomeando-a “Superiora e Diretora da Casa”.

A todos esses compromissos, ele se dedica com escrúpulo e dedicação, mas também com muita simplicidade, modéstia e verdadeira humildade, porque o seu único objetivo é ser um autêntico “servidor das almas”. Para a sua salvação, tende também com uma austera penitência, com o jejum, com a oração, a caridade e a paciente resignação das várias enfermidades, sobretudo aquela dos olhos.

A sua alma era continuamente unida a Deus e a sua vida mística estava se aproximando sempre mais dos limites da santidade.

Também como Superior, o seu estilo de vida não muda, ao contrário, torna-se ainda mais perfeito e exemplar: oração, sacrifício e simplicidade. Os peregrinos mais necessitados são acolhidos por ele em pessoa, com os maiores cuidados. Por vezes era visto dando o braço a um pobre cego para fazê-lo passear em torno ao Planeau.

Infelizmente, porém as suas condições físicas pioram inexoravelmente. São os sintomas que o conduziram à morte apenas aos 55 anos!

 

Uma morte santa e edificante

É 1º de agosto de 1885. Padre Giraud, no entanto, cansado e esgotado, parte para pregar um Retiro a um grupo de sacerdotes reunidos em Fontfroide, na Diocese de Pertignan. Chega destruído. Por alguns dias consegue ainda celebrar a Santa Missa, embora com enorme esforço. Depois parte para Tarascon onde se hospeda no Hospital dos pobres, A Caridade. De lá contava retornar a casa para a Assunção. As suas forças, porém, diminuíram rapidamente. Estava agora aos extremos, tinha dificuldade também para falar. Ficando acamado, pediu à superiora da Casa para lhe levar uma estátua de Nossa Senhora de La Salette. Ao vê-la exclamou sereno, com um fio de voz: “Ó! A nossa boa Mãe! Quanto vos amo!”. Depois, tranquilamente inclinou a cabeça e expirou. Era 22 de agosto, um sábado, oitava da Assunção.

Hoje, os seus restos mortais repousam no pequeno cemitério em frente ao Santuário da Santa Montanha.

 

 

Referência

GRISA, Maria. Padre Silvano Giraud (1830-1885) – Il più celebre dei Missionari de La Salette: mistico, apostolo, scrittore. In: La Salette, Roma, ano 79, n. 5, p. 12-15, set./out. 2013. Disponível em: <https://pt.calameo.com/read/004755866aa5e78e82eac>. Acesso em: 22 nov. 2021. [Tradução de Irmão Geferson Radavelli Guisso, MS.]